HABITUAMO-NOS A VER tanta coisa desagradável no mundo que, muitas vezes, ações ou atitudes marcadas por respeito e amor ao próximo passam despercebidas. Excetuando os esforços para salvar os meninos presos numa caverna no norte da Tailândia, e que resultou em um esforço de resgate que rivalizou com a atenção dedicada à Copa do Mundo, há outros menores, de âmbito doméstico, cujo alcance e importância ficam em segundo plano. Refiro-me à Orquestra Maré do Amanhã. Costumamos dizer que a televisão, em quase 100% dos casos, invade nossa casa para apresentar bobagens dos mais diversos tipos. Mas, às vezes, nos deparamos com algo que vale nossa atenção. Assim é que, por acaso, assisti à repetição de um programa de entrevistas no qual estava presente o idealizador da referida orquestra, Carlos Eduardo Prazeres. O que a Orquestra Maré do Amanhã tem de especial? Ela é integrada por jovens moradores do tristemente famoso Complexo da Maré, no Rio de Janeiro. Na verdade, o projeto compõe-se de um sexteto, uma camerata, a orquestra (com 40 integrantes) e a orquestra infantil, com mais de uma centena de crianças. O idealizador escolheu o Complexo da Maré porque seu pai, maestro, foi sequestrado e morto por bandidos daquela região há cerca de 10 anos, e foi exatamente na Maré que ele resolveu, em memória do pai, iniciar seu projeto. Talvez, para muitos, não seja algo que merece mais que um programa de televisão, mas estou certo de que ações dessa natureza são o caminho mais seguro não apenas para se construir um amanhã socialmente justo mas, também, para tirar adolescentes e jovens do caminho da marginalização. Ninguém duvida que a realidade em nosso país é das mais preocupantes. Sem a poesia do verso camoniano, o Brasil está em bravo mar perdido o lenho. Creio que vivemos um dos piores (talvez o pior) momentos de nossa história. Setores básicos e essenciais para o bem-estar do cidadão são negligenciados pelo Estado e a violência alcança níveis assustadores, com o envolvimento, cada vez maior, de menores e, mesmo, por absurdo que pareça, de crianças. Os noticiários estão aí para, diariamente, nos mostrarem o cenário de horror em que vivemos. Assim, projetos como a Orquestra Maré do Amanhã são esforços mais que válidos para se construir uma nova realidade, na qual poderemos ver, afinal, que há esperança para a humanidade e que não é utopia sonharmos com um futuro bem melhor.
Geraldo Campos é professor, com passagem pela UnB e pela Universidade Católica de Brasília, jornalista e, nas horas vagas, contista (com alguns prêmios). Começou no jornalismo como revisor do Jornal do Brasil e, posteriormente, da revista Manchete. Passou por outros veículos de comunicação entre os quais as Tvs Aratins e Araguaína, no Tocantins, nas quais foi diretor de jornalismo. Tem, no currículo, trabalhos para a editora da UnB, o Banco Interamericano de Desenvolvimento e a Secretaria de Reforma do Judiciário, entre outros.